Jorge Ferraz, músico e compositor português de vanguarda, edita hoje o seu mais recente ãlbum Colonial Wars, que estará apenas disponível em formato digital e no Bandcamp.
Mas o porquê do nome de Colonial Wars a este álbum de 27 temas, maioritariamente instrumentais? O músico e compositor Jorge Ferraz explica-nos que “não há uma resposta linear, pois só apareceu quando parte das músicas já estava composta. Começou por ser o resultado de uma espécie de tomada de consciência sobre o rumo sugerido pelas músicas que ia compondo, pelos textos e poetas que ia escolhendo e pelas temáticas que me anda(va)m a preocupar. Depois, isso foi motivo para pensar em novas músicas e temas e moldar melhor e de modo mais consequente o que já tinha sido feito antes. Em rigor, há coisas no álbum que eu sei do que se trata e outras que não consigo bem perceber para onde vão e que assim quero deixar”.
Existe toda uma lógica entre todos os temas apresentados em Colonial Wars, dos instrumentais aos cantados (em jeito de declamação pela artista Ondina Pires). Para Jorge Ferraz, este disco acaba por ser uma “uma espécie de coletânea de poemas musicais sobre a dimensão mágica, caleidoscópica, fascinante e profundamente assustadora que o nosso mundo, os nossos sonhos e a tecnologia nos oferecem. Lá, onde o biológico se intersecta com o tecnológico, as máquinas ganham propriedades demiúrgicas e os vírus se tornam nossos estranhos irmãos-colonos e adquirem capacidade de sonhar. Lá, onde todo o encontro se transforma numa guerra civil entre irmãos que não sabem que o são, numa eterna luta de baixa densidade numa selva futurista que nos é hostil cheia de destroços de um mundo humano que alguns estranhamente querem dominar. O desencontro lento e por vezes tristemente violento como modo de vida. Os textos dos 5 temas não instrumentais, da autoria de F. Garcia Lorca, V. Maiakovksi, A. Artaud (este, premonitoriamente sobre peste e epidemia) e do livro do Apocalipse de João do Novo Testamento, lidos por Ondina Pires, também para aí nos conduzem.”
Falando de Ondina Pires (música, artista plástica e tantas outras coisas), perguntamos a Jorge Ferraz o porquê da sua participação neste disco. O compositor deu-nos exatamente 5 razões para que tal acontecesse “É uma amiga de longa data; É uma artista muito criativa com um belo timbre de voz, que diz muito bem e serve às mil maravilhas os textos usados. Já antes tinha trabalhado com ela e com resultados gratificantes: na 1ª fase dos Ezra Pound e a Loucura (1983-84) antes do seu ingresso nos Pop Dell ‘Arte; quando produzi o segundo álbum de uma das bandas a que pertenceu, os The Great Lesbian Show; no colectivo Cellarius Noisy Machinae a que ambos pertencemos. Partilhamos uma paixão antiga pelos textos e poetas escolhidos para o álbum, bem como pela dimensão onírica, excessiva e apocalíptica de muito do que aparece na Bíblia e, alguns dos temas do álbum são desenvolvimentos e mutações de músicas e textos que apareciam no espectáculo multimédia “Frankenstein Revisited” dos Cellarius Noisy Machinae“.
O álbum Colonial Wars, disponível a partir de hoje, apenas no Bandcamp do artista é anunciado com um vídeo do tema “How to recognise your own logic Frankenstein” criado por Vasco Bação e Carlos Mendes, autores do documentário “Ama Romanta – Uma utopia que fazia discos”
Biografia
Guitarrista (embora trabalhe com variado equipamento eletrónico e digital, a guitarra e a guitartrónica são a sua grande obsessão), compositor e produtor, em atividade desde 1983. Fundou e liderou algumas bandas portuguesas underground com destaque para Santa Maria, Gasolina em Teu Ventre! (cujo primeiro disco foi considerado em 1998, num trabalho conjunto do Público e da FNAC, um dos melhores discos da música popular portuguesa de 1960 a 1997), Ezra Pound e a Loucura, ou Fatimah X. Em 2006 passou a trabalhar em nome próprio, tendo publicado, desde então, três álbuns (em 2008, 2010 e 2018). Edita agora em formato digital e como edição de autor o seu quarto álbum em nome próprio.
Em 2014, no número comemorativo dos 30 anos da revista Blitz, foi considerado um dos melhores 30 guitarristas portugueses dos últimos 30 anos.
Foi ainda cofundador da efémera banda João Peste & o Acidoxibordel que reuniu, entre outros, músicos dos Pop Dell’Arte e dos Santa Maria, Gasolina em Teu Ventre!, bem como o saxofonista Rodrigo Amado.
Foi produtor dos seus discos a solo e da maioria das edições das bandas que integrou. Foi ainda co-produtor do EP “So Goodnight” dos Pop Dell’Arte (editado em 2002)) e produtor do álbum “You’re Not Human Tonight” dos The Great Lesbian Show (editado em 2008).
Publicou também poesia e ensaio em revistas como “Vértice” “Bumerangue”, bem como um livro de contos, “Telescópio Quebrado Scanner Descontínuo” na Black Sun Editores.
Ferraz é ainda doutorado em Sociologia e publicou, nesse contexto, alguns textos científicos versando principalmente as problemáticas da ideologia, globalização, direitos humanos, interculturalidade e turismo nas sociedades contemporâneas.
Desde 2013 que é igualmente membro fundador do colectivo de criadores Cellarius Noisy, espaço de colaboração e entreajuda entre vários artistas out of the grid / out of sight das áreas da música, das artes visuais e do multimédia. Alguns dos membros deste colectivo estão também envolvidos na criação da componente visual dos concertos de Jorge Ferraz.